Tertúlia Liberal

Pretende-se REFLECTIR o mundo e a sociedade, com uma nota crítica mas sem pessimismos.

segunda-feira, outubro 17, 2005

Cultura de responsabilidade (revisited)

A actual situação do Sporting lembra-me, novamente, a questão da cultura de responsabilidades.
Concordo com a análise - não sei se com as percentagens - que Paulo Martins aqui postou, mas creio que o problema se reconduz, verdadeiramente, ao laxismo vigente.

O grande problema é que a culpa, em Portugal, morre solteira.

Senão vejamos:

1. A equipa é fraca? Não tínhamos orçamento para igualar os rivais (como sabem, estamos perto de nos tornarmos o 4º orçamento da Liga), mas tínhamos seguramente orçamento para não esbanjar dinheiro.
1.1. No meio de tudo isto, andámos a comprar trintões com mais dois anos de carreira, esperanças jovens para lugares preenchidos por três ou quatro veteranos, não renovamos com o jogador mais influente da equipa e líder do balneário, não renovamos com o "abono de família" da equipa que, amavelmente, nos tem devolvido a indiferença com exibições francamente sofríveis.
1.2. Não creio que seja este o problema.

2. Peseiro tem a culpa? Foi ele que escolheu a equipa (com os resultados que se vêm), foi ele que tratou da preparação física (com os resultados que se vêm), é ele que selecciona o 11 (com os resultados que se vêm). Mas será ele o culpado?
2.1. À hora a que escrevo este post, um portal de desporto noticia que Dias da Cunha tenta ainda segurar o treinador que, Sexta como hoje, terá apresentado a demissão. Denota - pelo menos isso, reconheço-lhe - dignidade.
2.2. No meio de tudo isto, e com metade da defesa no estaleiro, a culpa é dele? Só em parte, já que nem todos estão a recuperar de lesões musculares.

3. O que vimos ontem foi mais do que uma má exibição: foi um linchamento. Não porque alguns jovens menos educados resolveram passar as suas frustrações para os lençois de lá de casa. Não porque alguns jovens menos conscientes resolveram "visitar" a sede da SAD após o jogo, mas pela conduta dos jogadores.
3.1. Que o trintão Ricardo Sá Pinto corresse mais do que muitos jovens, já nós estávamos habituados; agora, que Ricardo Sá Pinto seja o único a correr, já considero mais impróprio...
3.2. Problemas? Problemas têm os jogadores do Vitória de Setúbal que - consta - não recebem no final de cada mês. E têm a dignidade de jogar o que o emblema, com menos lustro mas com a mesma história, lhes exige.

4. No meio de tudo isto, que dizer de Meireles, segundo consta perito em números, ou de Paulo de Andrade, que pelo que se tem visto apenas percebe de ténis?
4.1. A resposta é que serão porventura os homens certos, mas que seguramente estarão no local errado.
4.2. Escolheram mal os jogadores? Planearam mal a temporada? Fugiram face à contestação dos adeptos? É desastroso, inapropriado, e -com alguma franqueza - não é uma decisão plena de maturidade.
4.3. Mas não são, tanto quanto me lembro, os primeiros a saír. Não são os primeiros a errar. E os que não falham, não sairam por razões pessoais ou profissionais. Não nos tomem por ingénuos...

5. Fica o responsável pelo casting. Que tem Dias da Cunha a dizer sobre o assunto?
5.1. Que o Sporting é vítima de um sistema malévolo? Ok. Concede-se, mas não basta.
5.2. Que o Sporting é vítima de uma oposição sem cara? Até nem é mentira, mas não explica tudo.
5.3. Que temos um grupo de sócios (malvados) que incomodam a excelsa direcção com a sua opinião?

6. Porque é que estes problemas são falsos problemas?
6.1. O que referimos em 5.1. não bastou para impedir a vitória do campeonato por Augusto Inácio... Numa equipa a quem poucos auguravam alegrias, onde poucos pontificavam, mas onde poucos tocavam fora de tom. Eu estive em todos os jogos de Alvalade, alguns fora (incluindo Paranhos) porque nunca deixei de acreditar.
6.2. O que referimos em 5.2. explica, porventura, o comportamento das claques. Não mais do que isso.
6.3. O que referimos em 5.3., ainda que removido do discurso oficial, foi repetidamente insinuado por Dias da Cunha e - à data - Soares Franco. Não creio.

7. Porque tenho Dias da Cunha por homem de bem, não quero crer que se agarre ao lugar em torno da vã glória de ficar na história como o presidente do centenário.
7.1. Em primeiro lugar, porque não percebo em que quer acompanhar Pinto da Costa e Luis Filipe Vieira.
7.2. Em segundo lugar, porque os interesses a manter não são os pessoais.
7.3. Em terceiro lugar, porque um líder que falha repetidamente no casting, tem que assumir as suas responsabilidades.

8. Ou também aqui a culpa morre solteira?

Post Scriptum - A circunstância de a generalidade dos corpos sociais ter um alinhamento político sobejamente conhecido, quando conjugada com o meu entendimento acerca do culto da irresponsabilidade propugnado pelas forças de esquerda, confesso, dão-me que pensar.